
1974 - Atualidade
ERJ
Em 1974, o General Ernesto Geisel, sucessor de Médici na Presidência da República, decidiu pela desativação das funções do Executivo Federal no Palácio das Laranjeiras. O antigo palacete, que desde 1956 servia aos presidentes e suas famílias, foi então passado à administração do novo Estado do Rio de Janeiro, criado a partir da integração do Estado da Guanabara ao território fluminense. A casa passou a servir de residência oficial aos governadores do Estado. O Vice-Almirante Floriano Faria Lima, ex-Presidente da Petrobrás, foi o escolhido por Geisel para gerir o processo de fusão entre os dois Estados. O Governador Faria Lima e sua esposa, Hilda, foram os primeiros moradores do Palácio sob a nova condição.
Nas eleições indiretas para governador de Estado, em novembro de 1978, foi eleito no Rio de Janeiro o advogado Antônio de Pádua Chagas Freitas, um dos líderes do MDB. O novo governador e sua esposa, Zoé Noronha Chagas Freitas, foram residir no Palácio das Laranjeiras em março de 1979. A situação do palacete era precária. Conta a Primeira-dama que a imagem de “palácio encantado” de sua infância, visto por entre as árvores do Parque Guinle, havia sido imediatamente desfeita ao visitá-lo: tudo - fachadas, parquets, boiseries, mosaicos, mármores, lustres, tapetes, móveis e obras de arte - carecia de reparos urgentes. Naquele mesmo ano foram iniciadas as obras de restauro, tanto das fachadas como dos interiores e do acervo. Capitaneadas pela própria Primeira-dama, as intervenções alongaram-se até 1982. O antigo Palacete Eduardo Guinle voltava aos poucos a exibir sua exuberância francesa original.
Em 1982, o país se preparava para a primeira eleição direta e multipartidária para governadores. Com o pleito que se aproximava, começava a distensão do Ditadura Militar. E o Palácio das Laranjeiras, mais uma vez, representava a situação política vivida pelos brasileiros. Após anos restrito ao uso dos presidentes, chegara a vez de um grupo de crianças, alunos e alunas da 4ª série de uma escola municipal localizada no Bairro Jabour, em Senador Camará, Zona Oeste do Rio, visitar o interior da casa. Raras vezes os salões do Laranjeiras haviam sido franqueados ao público carioca. A professora que acompanhava o grupo ficou tão entusiasmada com a oportunidade que até exagerou, ao anunciar às crianças: “Vocês estão entrando em um palácio, onde moram reis, príncipes e presidentes!”.
Além do restauro, naquele ano o Palácio recebeu duas significativas homenagens: o tombamento federal, por meio de parecer favorável dado pelo IPHAN, e a publicação do livro “Palácio das Laranjeiras”, editado pelo Governo do Estado, com fotos dos ambientes após o restauro e textos inéditos de autoria do professor Mário Henrique Glicério Torres.
Leonel de Moura Brizola, candidato do Partido Democrático Trabalhista, venceu as eleições diretas para governador do Estado, em 1982. O novo governador e sua esposa, Neusa Goulart Brizola, irmã do ex-Presidente João Goulart, mudaram-se para o Palácio das Laranjeiras no ano seguinte. A chegada de Brizola e de Neusa ao Palácio era bastante simbólica: fora dali que, em 1º de abril de 1964, Jango havia partido para Brasília, em meio ao golpe militar que o depôs. Durante seu governo, Brizola recebeu diversas personalidades da política no Palácio, como o Chanceler da Bolívia, Ortiz Mercado; o Presidente do México, Miguel de la Madrid; O Ministro das Relações Exteriores da França, Claude Cheysson; e o Rei Carlos Gustavo e a Rainha Silvia, da Suécia. O Deputado Ulysses Guimarães, um dos líderes da oposição ao Regime Militar, era outro visitante assíduo no Laranjeiras. Certa vez, a conversa entre o deputado e o governador havia avançado pela noite, e Brizola convidou Ulysses Guimarães, dado o adiantado da hora, a pernoitar em um dos quartos do Palácio. Mas o simbolismo político da casa ainda estava muito presente na memória do deputado do PMDB, que respondeu: “Doutor Brizola, nem o senhor consegue dormir aqui de tantas assombrações”.
Em 1984, o Governador Leonel Brizola reuniu para um almoço no Palácio das Laranjeiras um grupo de importantes lideranças políticas. Estavam marcadas para 1985 as eleições indiretas para Presidente da República e os candidatos de oposição articulavam-se. Naquele domingo, dia 30 de setembro, foram recebidos no Laranjeiras o candidato à presidência Tancredo Neves; o Governador de São Paulo, Franco Montoro; Ulysses Guimarães, presidente do PMDB; o Presidente do PT, Luís Inácio Lula da Silva e o Presidente do PDT, Doutel de Andrade. Participaram também do almoço o Ex-Chanceler alemão Willy Brandt, o então Primeiro-Ministro de Portugal Mário Soares, o Ex-Presidente da Venezuela Carlos Andrés Perez e o Primeiro-Secretário do Partido Socialista francês Lionel Jospin.
Em 1987, o Palácio das Laranjeiras recebeu novos moradores: o Governador eleito Wellington Moreira Franco, ex-prefeito de Niterói, e sua esposa, a socióloga Celina Vargas do Amaral Peixoto, neta de Getúlio Vargas. O país vivia naquele ano o clima de efervescência causado pela Assembléia Nacional Constituinte, reunida no Congresso, em Brasília, com a finalidade de redigir uma nova Carta Constitucional. O Governador do Rio, filiado ao PMDB, participava ativamente das articulações, reunindo-se no Palácio das Laranjeiras com as principais lideranças políticas do momento, entre elas os governadores da Bahia, Waldir Pires; de São Paulo, Orestes Quércia; de Pernambuco, Miguel Arrais; do Rio Grande do Sul, Pedro Simon e Fernando Collor de Melo, de Alagoas; além dos então senadores José Richa, Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas.
Leonel Brizola foi reeleito governador do Estado do Rio nas eleições de 1990, sendo empossado no cargo em março do ano seguinte. Durante a Conferência Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento - a ECO 92 - o Palácio das Laranjeiras, usado por Brizola em seu segundo mandato apenas em reuniões ou eventos oficiais, ficou a disposição do Presidente da República Fernando Collor de Melo e sua esposa, Rosane Collor de Melo. A conferência, promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), ocorreu na cidade do Rio de Janeiro em junho de 1992. Enquanto acontecia da ECO 92, em Brasília a Câmara de Deputados abria uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar as denúncias de corrupção contra Collor, feitas por seu próprio irmão, Pedro Collor.
Entre 1995 e 1998, o Palácio das Laranjeiras virou novamente a residência oficial da Presidência da República no Rio. O Governador Marcello Alencar cedeu o Palácio ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e sua esposa, Ruth, para se hospedarem durante estadas na cidade. E foram várias as ocasiões em que o casal se hospedou no Laranjeiras: uma delas foi quando FHC recebeu para um café da manhã o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, para conversarem sobre ações de combate à miséria no país. Em outra, em um dia quente típico do verão carioca, o Presidente e a Primeira-dama receberam para o almoço o Governador Marcello Alencar, o Vice-Governador Luiz Paulo da Rocha e os senadores eleitos pelo Rio, Benedita da Silva e Arthur da Távola. O salão de jantar do Palácio das Laranjeiras não possuía sistema de refrigeração e suas boiseries e pesadas cortinas acabavam por aumentar a sensação de calor no ambiente. O Presidente, quebrando o protocolo, tirou o paletó, no que foi seguido pelos convidados. Ao ser questionado pelos repórteres, FHC disse que havia consultado o chefe do cerimonial, que tinha autorizado. Mas completou: “Mas mesmo que ele não deixasse eu tirava!”.
No dia 3 de outubro de 1997, o Presidente Fernando Henrique Cardoso e a Primeira-dama Ruth Cardoso receberam o Papa João Paulo II no Palácio das Laranjeiras. O Pontífice estava no Rio para participar do II Encontro Mundial com as Famílias. A visita do Papa ao Palácio, acompanhado pelo Arcebispo do Rio, Dom Eugênio Sales, levou uma multidão ao Parque Guinle, que erguia bandeiras brancas. A presença de militares armados com fuzis no acesso ao Palácio incomodou muito João Paulo II, que pediu ao Arcebispo que o esquema de segurança fosse menos ostensivo.
Em 2000, o Governo Brasileiro comemorou os 500 anos da chegada dos portugueses a Porto Seguro, na Bahia. A celebração da data histórica contou com uma série de eventos. O anúncio oficial da exposição “Mostra do Redescobrimento: Brasil + 500” ocorreu no Palácio das Laranjeiras e contou com a presença do Secretário Estadual de Cultura do Governo Anthony Garotinho, Adriano de Aquino, e Edmar Cid Ferreira, Presidente da Associação Brasil 500 anos Artes Visuais, e Helena Severo, coordenadora do evento. Os organizadores da mostra, que aconteceria simultaneamente em diversos museus e espaços culturais cariocas, prometiam apresentar ao público cerca de 7 mil obras de arte, relativas à história, à cultura e às tradições brasileiras.
Em 2001, após obras de restauração patrocinadas pela Petrobrás, o Governador Anthony Garotinho e sua esposa, Rosinha Garotinho, abriram a ala social do Palácio das Laranjeiras ao público. Alunos do curso de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro foram selecionados para serem monitores das visitações, que logo tornaram-se um sucesso de público. Durante o Governo de Benedita da Silva, a primeira mulher negra a assumir o Executivo Estadual, as visitas à residência oficial continuaram a ocorrer.
Durante o governo da ex-Primeira-dama Rosinha Garotinho, que assumiu o cargo em 2003, o Palácio das Laranjeiras serviu de set à produção do filme “Bela noite para voar”, dirigido por Zelito Viana e baseado na biografia do ex-Presidente Juscelino Kubitscheck. Em Novembro de 2004, a Governadora recebeu no salão de jantar do Laranjeiras o Presidente da China Hu Jintao e sua esposa, Liu Yongqinq.
Em 2009, na gestão do Governador Sérgio Cabral Filho, foi iniciado um grande projeto de restauração e modernização das instalações do Palácio das Laranjeiras. Prestes a completar seu centenário, o antigo Palacete Eduardo Guinle recebeu de presente uma ampla intervenção, que contemplou o reforma da cobertura e das fachadas, além de uma minuciosa restauração dos pisos de parquets e de mosaicos, das peças de mármores, das boiseries, das pinturas e dos estuques dos tetos. Durante as obras, grande parte do mobiliário original da casa, inclusive peças raras que já estavam fora de uso há anos, também foi incluída nas ações de restauro. As pinturas da coleção de arte da casa também receberam cuidados, com destaque para o quadro “Nobre Veneziana”, do século XVI, de autoria do italiano Moretto de Brescia, cujos tons, esmaecidos pela ação do tempo, voltaram à beleza original após a iniciativa.
As obras alcançaram também as instalações hidráulicas, elétricas e de proteção contra incêndio, já bastante gastas e ultrapassadas, que foram redimensionadas e atualizadas. Alguns reservatórios de água, instalados sobre a laje do segundo pavimento, colocavam em risco os ornamentos dos tetos e por isso tiveram de ser retirados. Além disso, a casa foi criteriosamente adaptada para receber um moderno sistema de climatização, que possibilitou a retirada de antigos aparelhos de ar condicionado, que interferiam na decoração original.
Um elevador foi instalado no interior da torre do Belvedere, para facilitar o acesso entre os andares do Palácio. Os jardins receberam um novo paisagismo, mais condizente com o desenho francês de época, e algumas árvores, cujas raízes e copas ameaçavam a estrutura do Palácio, tiveram de ser removidas.
As obras se estenderam até 2016, já no Governo de Luiz Fernando Pezão, e foram patrocinadas por várias empresas, por meio das leis de incentivo à cultura, e supervisionadas pelas equipes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN - e do Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - INEPAC. Todo esse conjunto de ações de restauração e modernização teve por objetivo não apenas resgatar a arquitetura original do Palácio das Laranjeiras, mas também permitir a sua abertura à visitação pública. Mais uma vez, a histórica residência oficial, por onde passaram tantos personagens da crônica política nacional, será aberta ao povo, que poderá apreciar a beleza de sua arquitetura e conhecer um pouco mais de sua história.

Detalhe da tela de Moretto de Brescia, do século XVI, antes e após a restauração. (Acervo Holos Consultores).

Obras de restauro das fachadas do Palácio das Laranjeiras. (Acervo Concrejato) - Foto: Francisco Moreira da Costa.

Operários trabalham na restauração do portão de ferro do Hall do Palácio das Laranjeiras. (Acervo Concrejato) - Foto: Francisco Moreira da Costa.